terça-feira, 9 de abril de 2013

Parte I - Como saber regressar...

.. quando já me perdi tantas vezes?

Com inspiração na Ju decidi voltar a escrever para ver como me sentiria depois. Mas confesso que se desapareci foi porque mais uma vez deitei tudo a perder na parte alimentar e não tive coragem para assumir nem sequer comigo mesma, que o que estava a fazer não estava a resultar e que o problema-chave continuava a ser ignorado.

Mesmo neste momento em que escrevo isto, sinto-me um disco riscado com uma canção irritante. Mas tal como a Ju costuma dizer, todos temos os nosso padrões e ciclos à espera de serem quebrados. Talvez a vida inteira seja um grande ciclo no qual cometemos os mesmo erros, outra e outra vez, até que haja finalmente a percepção de que se fizermos algo diferente, talvez o caminho também o seja. Antes de falar da comida e do peso todo que ganhei de volta e das frustrações, compulsões e 'auto-flagelações' alimentares, achei por bem que vocês devessem conhecer-me um pouco melhor.

Parte do meu problema-chave que me remete para as flutuações de peso, passa pela aceitação e pela libertação da culpa. Desde que me lembro de ser pessoa que exijo o impossível de mim e quando, naturalmente, falho perante o impossível sou a mais cruel das castigadoras. Ao ponto de ignorar todas as batalhas efectivamente vencidas a caminho do impossível, dos ganhos e evolução óbvia. Sempre achei que essas evoluções e batalhas ganhas eram migalhas face aos grandes objectivos que tinha de cumprir. Parte deles sempre foram a estabilidade económica e pessoal, como um emprego que pagasse razoavelmente no qual eu pudesse evoluir e aprender a ser melhor e uma casa minha onde pudesse haver quartos para receber quem eu gosto e proteger quem precise. Posso tentar não olhar muitas vezes para a fonte desses sentimentos, desejos e medos mas, definitivamente, tudo isto está relacionado com a responsabilidade que sinto desde muito pequena para com a minha irmã mais velha, que tem autismo e que é completamente dependente dos meus pais. Pais que um dia não estarão cá e que contam comigo para cuidar dela e se possível continuar a cobrir todas as despesas MUITO altas de medicação, educação especial, etc. Felizmente não devo este sentimento absurdo de exigência para comigo mesma aos meus pais, porque eles nunca me incutiram isso e sempre tentaram deixar uma conta bancária com o mínimo dos mínimos (com muito custo da parte do meu pai, como 10 anos a trabalhar em 2 trabalhos sem qualquer folga semanal) para caso no futuro fosse necessário dar-me essa escolha.

Por alguma razão, a partir de certa altura decidi que tinha de ser o oposto à minha irmã, ou seja, independente, adaptada ao mundo e às suas dificuldades, como se de uma preparação mental e espiritual se tratasse. Comecei a trabalhar com 15 anos com a minha mãe, cheguei a tomar conta do pronto a comer dela sozinha vários dias por semana enquanto ela descansava e recuperava de muitas horas a cozinhar sozinha e para ela poder ver e cuidar da minha irmã. Aos 16 trabalhei numa loja de decoração perto da minha casa. Aos 17 trabalhei num restaurante e celebrei lá o meu 18º aniversário. Aos 19 entrei na faculdade e fiz um estágio de alguns meses não reumunerado, aos 20 trabalhei num call-center e depois fiz outro estágio aos 21. Aos 22 terminei o curso e 1 mês depois estava a trabalhar num bar de Jazz. depois disso nunca estive mais do que 15 dias sem trabalhar e cheguei a fazer outro estágio (neste caso remunerado) de 1 ano. Saí de casa dos meus pais com 23 anos ainda, fiz os 24 logo a seguir. Hoje, aos 25, quase 26 depois de ter chegado a trabalhar 13h por dia para pagar a renda e passando algumas dificuldades, consegui finalmente o emprego que queria e estou na empresa que finalmente me está a valorizar (ao fim de um ano) com um seguro de saúde e subsídio de Natal e Férias, coisa que não sabia que existia há uns anos atrás. Aliás, vou ter férias a sério, oficiais e pagas pela primeira vez na vida. Nos outros trabalhos temporários, nunca tive hipótese. Ou porque eram estágios ou porque eram mesmo temporários. As minhas 'férias' sempre foram a semana ou duas que passava entre dois trabalhos, enclausurada em casa a enviar centenas de CVS e a esticar a minha rede até onde podia para arranjar contactos para onde enviar mais CVS, a ir a entrevistas de todo o tipo de trabalhos e a comer atum para o dinheiro chegar para a renda seguinte. 
Regressei a casa dos meus pais em Janeiro porque na altura as coisas complicaram-se no meu trabalho e estive prestes a ser dispensada por falta de verbas e quase-cancelamento de um cliente da minha empresa. Felizmente esse cliente para o qual trabalho manteve, ainda que de forma instável, o contrato com a minha empresa e assim pude planear férias e ganhar esse seguro de saúde. Ainda assim, decidi permanecer na casa dos meus pais, para juntar dinheiro e para os ajudar no que pudesse, inclusivamente, pagar-lhes eu X todos os meses agora que tudo se está a complicar para eles.

Ainda que o meu emprego continue demasiado calmo e sem perspectivas de coisas novas e dinâmicas que eu preciso para me manter motivada, com este investimento que fizeram em mim e finalmente com colegas que estão do meu lado e que valorizam o que eu faço, ganhei um novo ânimo para suportar os 'ossos do ofício'. No entanto, nem tudo são rosas... e realmente há quem diga e com razão, que muitas vezes, temos sorte no trabalho... e azar no amor.


Amanhã escreverei sobre a parte mais difícil e parcialmente a razão para me ter isolado, outra vez, do mundo.

Beijo *

4 comentários:

  1. Gosto de te ter aqui comigo, pronta para lutar contra nós próprias e ao mesmo tempo a nosso favor. Passo a passo, vamos deixando migalhas pelos caminhos que já percorrendo, e saberemos não voltar ao mesmo sítio.
    Já há muito que reconheci o peso que sempre carregaste e não quiseste admitir para ti mesma. Não te sintas nunca culpada por nada isso, amas muito a tua irmã e todas as tuas preocupações são naturais. Quanto a isso, e a tudo o resto... everything's gonna be okay. And I'm here, as I know you're too <3

    ResponderEliminar
  2. Olá!
    Sei que não me conheces, nunca falamos e nem sei como encontrei o teu cantinho, mas ofereço-te o meu apoio e estarei por aqui se precisares!

    beijinhos

    ResponderEliminar
  3. Gostei mais de conhece-la, somente assim, entendo todo sua luta e batalhas.
    Não é fácil, a situação da sua irmã, e bens sabes, que seus pais, infelizmente, não estarão presentes por muito tempo. E a responsabilidde recaí sobre ti. É difícil... mas são "ossos da vida".

    Olha, vc é um menina bastante batalhandora, tem uma carga enorme, e vem lutando para se estabelizar-se em um emprego, que seja digo, de pagar todos os seus direitos, e vc realmente vai ter féiras que sempre mereceu.

    Torço por ti!
    E acredito, que vc sempre vencerá!

    Estava com muitas saudades suas.

    A que toda gente que gosta de ti!

    Um enorme abraço!

    Lia*

    ResponderEliminar
  4. ah, não imaginas o tamanho do meu sorriso quando vi que voltaste :) minha querida! sabia que o que o teu afastamento significava mas também sei o que é querermos estar escondidas: só voltamos pelo nosso próprio pé quando acharmos que é a altura certa. Temos ambas o problema de carregar todos nos nossos ombros e não desistir das batalhas mesmo quando já estão perdidas. é altura de ires à tua procura :) e eu estou sempre aqui!

    beijinhos

    ResponderEliminar